Parte II: O mundo espírita – Capítulo IV: Múltiplas existências – Semelhanças físicas e morais

Livro dos Espíritos: linguagem simplificada - Semelhanças físicas e morais

 

Semelhanças físicas e morais

 

207.

Frequentemente os pais transmitem para seus filhos uma aparência física que lembra a aparência física dos pais. Os pais também transmitem para seus filhos uma aparência moral que lembre a aparência moral dos pais?

 

Não, porque as almas dos pais são diferentes das almas dos filhos. O corpo físico dos filhos é criado através dos corpos físicos dos pais, mas os Espíritos dos filhos não são criados através dos Espíritos dos pais (a moralidade, e o grau daquela moralidade, é uma qualidade do Espírito). Entre os descendentes (corpos físicos) de um homem e esse homem há apenas laços de sangue.

 

207a.

De onde vem as semelhanças morais que às vezes existem entre pais e filhos?

 

Neste caso os Espíritos dos pais e os Espíritos dos filhos são Espíritos simpáticos que foram atraídos uns pelos outros (para encarnarem em uma mesma família) por causa da semelhança de suas tendências (inclinações) morais.

 

208.

Depois do nascimento dos filhos, os Espíritos dos pais não tem nenhuma influência (moral) sobre os filhos? [1]

 

Ao contrário, os Espíritos dos pais tem grande influência (moral) sobre os filhos. Conforme já dissemos, os Espíritos tem que contribuir para o progresso (intelectual e moral) uns dos outros. Então, através da educação os Espíritos dos pais tem a missão de ajudar os Espíritos de seus filhos a progredirem. Essa é uma tarefa dos pais. Os pais serão culpados [2] se falharem em cumprir essa tarefa.

 

209.

Por que pais bons e virtuosos tem filhos com uma natureza má? Dizendo de outra forma, por que as boas qualidades (morais) dos pais nem sempre atraem – por simpatia – Espíritos bons para encarnarem em seus filhos?

 

Um Espírito mau (mais imperfeito) pode pedir para ter pais com Espíritos bons na esperança de que os conselhos bons dos pais conduzam aquele Espírito mau (mais imperfeito) para o caminho do bem. Nesses casos, muitas vezes Deus permite que o Espírito mau (mais imperfeito) tenha Espíritos bons como pais.

 

210.

Através de pensamentos e preces os pais podem atrair um Espírito bom para encarnação como filho (de preferência a um Espírito que seja inferior)?

 

Não. Mas os pais podem ajudar o Espírito que a eles foi confiado e que tenha encarnado como filho, procurando fazer com que o Espírito encarnado como filho se melhore (intelectualmente e moralmente). Esse é o dever dos pais. Quando pais bons tem filhos maus, os filhos maus são uma provação [3] para os pais.

 

211.

Muitas vezes dois irmãos (principalmente se forem gêmeos) tem um caráter bastante parecido. De onde vem essa semelhança de caráter dos irmãos?

 

Os irmãos são Espíritos simpáticos que se aproximaram porque tem sentimentos semelhantes. Esses Espíritos se sentem felizes por estarem juntos.

 

212.

Há dois Espíritos, ou duas almas, nas crianças com corpos que nascem ligados e que tem alguns órgãos em comum entre seus corpos? [4]

 

Sim, há duas almas, cada uma habitando um daqueles corpos físicos. Mas as almas que habitam esses corpos físicos são tão parecidas entre si que em muitos casos parecem ser uma só alma.

 

213.

Se em irmãos gêmeos estão encarnados Espíritos que se atraíram por simpatia, de onde vem a aversão (hostilidade) que às vezes se observa entre alguns irmãos gêmeos?

 

Não é regra que em irmãos gêmeos estejam encarnados Espíritos que tenham simpatia um pelo outro. Também acontece casos onde Espíritos maus (mais imperfeitos) decidem encarnar como irmãos gêmeos para lutarem (sic [5]) juntos no cenário da vida física.

 

214.

O que deve ser pensado sobre as histórias de crianças (gêmeas) que lutam (brigam) no seio materno?

 

Isso é só uma forma de falar. Para mostrar como era grande o ódio que os Espíritos encarnados nessas crianças tinham um pelo outro, é dito – de forma figurada – que as crianças lutavam (brigavam) uma com a outra antes mesmo de terem nascido. Em geral, não levem muito em conta essas imagens poéticas (sic [6]).

 

215.

Cada povo tem um caráter distinto (único). Qual é a origem (causa) disso?

 

Os Espíritos também se agrupam em famílias (espirituais), onde as famílias (espirituais) são formadas pela semelhança das inclinações (intelectuais e morais) daqueles Espíritos, inclinações que são mais ou menos puras conforme a elevação (espiritual) que aqueles Espíritos tenham alcançado.

 

Então, um povo (na Terra) é como uma grande família formada pela reunião de Espíritos de uma (grande) família espiritual que são simpáticos entre si, e que tem o costume de se agruparem na Terra quando estão encarnados; a semelhança das inclinações (intelectuais e morais) que existe entre os Espíritos encarnados na Terra como um povo é a origem do caráter distinto daquele povo.

 

Por acaso Espíritos que são bons e humanitários iriam procurar povos brutos e grosseiros para então encarnar entre os homens daquele povo? Não iriam. Os Espíritos simpatizam com as coletividades (grupos humanos ou espirituais) da mesma forma como os Espíritos simpatizam com indivíduos. Quando os Espíritos estão encarnados na coletividade (grupo humano) com que aqueles Espíritos simpatizam, aqueles Espíritos se acham (se sentem) em seu próprio ambiente.

 

216.

Em suas novas existências físicas, o Espírito conserva os traços do caráter moral de suas existências físicas anteriores?

 

Isso pode acontecer. Mas o caráter do Espírito muda quando o Espírito se melhora (estando encarnado ou não). Pode também ser (e geralmente é assim) que a posição social do Espírito em sua nova existência física possa ser diferente da posição social que o Espírito teve em sua existência física anterior. Se um Espírito era um escravo em uma existência física anterior, e passa a ser um senhor (de escravos) em sua nova existência física, os gostos (preferências) do Espírito em sua nova existência física são diferentes, e seria bastante difícil reconhecer o Espírito reencarnado.

 

Como o Espírito é sempre o mesmo nas diversas encarnações que o Espírito teve, o Espírito pode apresentar algumas características (morais) parecidas em suas diversas encarnações, mesmo que aquelas características possam se mostrar modificadas pelos hábitos da posição social que o Espírito tenha ocupado ou esteja ocupando. Isso pode continuar acontecendo até que o Espírito passe por um aperfeiçoamento (moral) visível que cause uma mudança completa do caráter do Espírito: se um Espírito se arrepende (dos erros de seu passado), o Espírito pode deixar de ser – por exemplo – um Espírito orgulhoso e mau, e pode passar a ser um Espírito humilde e bondoso.

 

217.

Em suas novas existências físicas, o Espírito conserva os traços físicos de suas existências físicas anteriores?

 

O novo corpo físico que um Espírito usa em uma nova existência física não tem relação alguma com o corpo físico que o Espírito usou em uma existência física anterior, e que foi destruído pela morte física.

 

Entretanto, os traços (morais) do Espírito aparecem no corpo físico. Sem dúvida alguma, o corpo físico é apenas matéria, mas mesmo assim o corpo físico pode ser modelado pelas capacidades (traços morais) do Espírito. Os traços (morais) do Espírito podem influenciar o corpo físico até certo ponto, principalmente no rosto; daí existe uma verdade quando se diz que os olhos são o espelho da alma. Isto é, especialmente o semblante de uma pessoa é um reflexo da alma daquela pessoa. Quando um Espírito bom, ponderado, e humanitário encarna como uma pessoa muito feia, essa pessoa tem um semblante que é agradável; ao mesmo tempo há pessoas com rostos belíssimos mas que não causam nenhuma impressão (especial) nas outras pessoas, e em alguns casos chegam até mesmo a causar repulsa.

 

Os homens poderiam pensar que somente os corpos físicos bem moldados serviriam de envoltório para os Espíritos mais perfeitos, quando o certo é que todos os dias os homens encontram outros homens de bem que tem corpos físicos com um exterior deformado.

 

Mesmo que não exista uma semelhança física muito visível entre as pessoas de uma mesma família terrena, a semelhança dos gostos (preferências) e das inclinações (morais) das pessoas de uma família terrena pode dar lugar ao que se costuma chamar de "ar de família".

 

 

 

 

É um absurdo comparar a semelhança da aparência física de uma pessoa com a aparência física de um outro alguém – que tenha vivido no passado – para concluir que o Espírito que encarnou nos corpos físicos naquelas duas existências físicas é um mesmo Espírito em encarnações sucessivas, pois a semelhança de aparência física existe apenas por um acaso, e o corpo físico que um Espírito usa em uma encarnação não tem necessariamente qualquer relação com o corpo físico que aquele Espírito usou em uma encarnação anterior (que pode, inclusive, ter uma procedência bastante diferente da procedência do corpo físico do Espírito em sua nova encarnação).

 

Entretanto, as qualidades do Espírito frequentemente modificam os órgãos do corpo físico que são usados (pelo Espírito) para manifestar aquelas qualidades. As qualidades do Espírito dão um ar especial ao semblante do corpo físico e ao conjunto das maneiras ("jeito de ser") do Espírito encarnado.

 

Dessa forma, em um homem com trajes humildes pode ser encontrada uma manifestação de grandeza e de dignidade, enquanto que uma manifestação de baixeza e de desonra pode frequentemente ser encontrada sob trajes distintos e majestosos [7].

 

Algumas pessoas que saíram das posições sociais mais humildes conseguem ter, sem esforços, os hábitos e as maneiras da alta sociedade, fazendo parecer que encontraram na alta sociedade o seu novo ambiente. Outras pessoas, entretanto, apesar do nascimento e da educação que tiveram, parecem estar sempre deslocadas e parecem não pertencer ao ambiente em que vivem. Isso não pode ser explicado senão como sendo um reflexo das existências passadas dos Espíritos encarnados naquelas pessoas.

 

 


 

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[1]        Pela resposta dos Espíritos superiores fica mais claro que a questão é sobre a influência dos Espíritos dos pais sobre os Espíritos dos filhos.

[2]        Na doutrina espírita, "culpa" é um sinônimo de "responsabilidade". Então, por "culpados" deve ser entendido "responsabilizados". Da mesma forma, não existe nem "punição" e nem "recompensa", existem "consequências" segundo as leis naturais e universais de Deus: uma ação má tem uma consequência ruim (vista pelos homens como "punição"), e uma ação boa tem uma consequência boa (vista pelos homens como "recompensa").

[3]        A provação para os pais está na dificuldade, no desafio que existe para pais bons terem que conviver com a natureza má dos filhos; uma coisa é uma pessoa boa ter que conviver com a maldade de um vizinho ou de um colega de trabalho, mas é outra coisa completamente diferente e mais muito mais difícil ter que conviver com a maldade de um filho (sem jamais abandonar a bondade e o amor).

[4]        Irmãos siameses.

[5]        Sic Erat Scriptum: traduzido como "assim estava escrito".

[6]        Sic Erat Scriptum: traduzido como "assim estava escrito".

[7]        Algumas destas observações de Allan Kardec não estão diretamente relacionadas com o assunto da questão 217 ("semelhança de corpos físicos entre encarnações sucessivas"). Allan Kardec aproveitou a oportunidade para fazer também observações sobre outras questões já abordadas antes da questão 217. Assim, em um momento Allan Kardec está falando sobre "semelhanças entre corpos físicos", e no momento imediatamente seguinte está falando sobre a ilusão que as roupas de uma pessoa pode causar sobre as qualidades morais da pessoa que veste aquelas roupas.

 

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