Parte I: Causas primárias – Capítulo I: Deus – Panteísmo
Panteísmo [1]
14. | Deus é um ser distinto, ou será – como algumas pessoas acham – um resultado da reunião de todas as forças e de todas as inteligências do universo? | |
| – | Se fosse assim, Deus não existiria, pois então Deus seria um efeito e não uma causa. Ele não pode ser as duas coisas (causa e efeito) ao mesmo tempo. Deus existe; sobre isso não pode haver dúvida, e isso é o essencial. Acredite em mim, não vá além disso. Não se perca em um labirinto (de idéias) de onde não vai conseguir sair. Ir além disso não faria o homem ser melhor, apenas ser um pouco mais orgulhoso e acreditando saber, quando na realidade o homem não saberia nada. Portanto, abandone todos esses sistemas (para compreender Deus); já há coisas suficientes que dizem respeito aos homens, começando por eles mesmos. Reflitam sobre suas próprias imperfeições a fim de ficarem livres delas, ao invés de tentar descobrir o que não pode ser descoberto pelos homens. |
15. | Existe uma opinião que diz que todos os corpos da natureza, todos os seres, todos os astros do universo seriam partes da Divindade e seriam, reunidos em conjunto, a própria Divindade (doutrina panteísta). O que pensar sobre isso? | |
| – | Como o homem não poder ser Deus, o homem quer ao menos ser uma parte de Deus. |
16. | Quem defende a doutrina panteísta pensa que a doutrina panteísta pode explicar alguns atributos de Deus: como os astros do universo são infinitos, Deus é infinito por isso mesmo; como não existe o vazio ou o nada em parte alguma, Deus está em toda parte; o motivo da existência de todos os fenômenos da natureza é um motivo inteligente vindo de Deus que está em toda parte, e Deus faz parte de tudo. Como esse pensamento pode ser combatido? | |||
| – | Pela razão e pelo raciocínio. Através de uma reflexão madura não é difícil perceber o absurdo desse pensamento. | ||
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A doutrina panteísta torna Deus um ser material que, embora possuindo uma inteligência suprema, seria em uma escala maior o que os homens são em uma escala menor. A matéria muda constantemente, e se Deus fizesse parte (também) da matéria, Deus estaria sujeito às transformações da matéria (e até mesmo a todas as necessidades da humanidade), sem qualquer estabilidade; não poderia ser imutável portanto. A imutabilidade é um dos atributos essenciais da Divindade. Deus ficaria rebaixado em nosso pensamento se a idéia de Deus fosse ligada às propriedades da matéria; não haveria esperteza de pensamentos, argumentos, e raciocínios que conseguisse resolver a questão da natureza íntima de Deus. Não sabemos tudo o que Deus é, mas sabemos o que ele não pode deixar de ser; a doutrina panteísta contradiz os atributos mais essenciais de Deus. A doutrina panteísta mistura e confunde o Criador com a criatura (como se um carro fosse parte integrante do engenheiro que o projetou, por exemplo). A inteligência de Deus aparece em suas obras, da mesma forma que a inteligência de um pintor aparece em um quadro que o pintor tenha pintado; mas, as obras de Deus não são o próprio Deus, assim como o quadro não é o próprio pintor que imaginou e pintou o quadro. |
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[1] Panteísmo: crença de que absolutamente tudo e todos compõem um Deus abrangente (inclui tudo), e imanente (faz parte de tudo e se confunde com tudo), ou que o Universo (ou a Natureza) e Deus são idênticos.
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