Parte II: O mundo espírita – Capítulo VI: Vida espírita – Percepções, sensações, e sofrimentos dos Espíritos

Livro dos Espíritos: linguagem simplificada - Percepções, sensações, e sofrimentos dos Espíritos

 

Percepções, sensações, e sofrimentos dos Espíritos

 

237.

Depois que a alma volta para o mundo dos Espíritos, a alma conserva as percepções [1] que a alma tinha quando a alma estava encarnada?

 

Sim. A alma também conserva outras percepções que a alma não tinha (enquanto o Espírito estava encarnado) porque o corpo físico escondia da alma aquelas percepções. A inteligência [2] é um atributo (qualidade) do Espírito, mas a inteligência se manifesta mais livremente quando a inteligência não precisa vencer nenhum obstáculo (como o corpo físico).

 

238.

Os conhecimentos e as percepções dos Espíritos são limitados? Dizendo de outra forma, os Espíritos sabem tudo?

 

Quanto mais os Espíritos se aproximam da perfeição, mais os Espíritos sabem. Os Espíritos (mais) superiores sabem muito. Os Espíritos (mais) inferiores são mais ou menos ignorantes sobre tudo.

 

239.

Os Espíritos conhecem o princípio das coisas?

 

Isso depende da elevação (na escala espírita [3]) e da pureza que os Espíritos tenham alcançado. Os Espíritos de ordem inferior não sabem mais do que os homens sabem sobre o princípio das coisas.

 

240.

Os Espíritos compreendem o tempo (duração) da mesma forma que os homens compreendem o tempo?

 

Não, e é por causa disso que nem sempre os homens entendem os Espíritos quando se trata de determinar datas ou épocas [4].

 

 

 

 

Os Espíritos vivem fora do tempo da forma como os homens compreendem o tempo. Por assim dizer, para os Espíritos a duração (do tempo) deixa de existir. Os séculos que são tão longos para os homens, para os Espíritos não passam de instantes que se perdem na eternidade (do mesmo modo que os relevos do solo se apagam e desaparecem para quem se eleva no espaço).

 

 

241.

Os Espíritos tem uma idéia mais precisa e mais justa do (momento) presente do que os homens tem?

 

Sim, do mesmo modo que alguém que tem uma boa visão faz uma idéia mais justa (melhor) das coisas do que um cego poderia fazer. Os Espíritos veem o que os homens não veem (não conseguem ver). Portanto, os Espíritos julgam (percebem) as coisas de um modo diferente dos julgamentos que os homens fazem; mas isso – também – depende do grau de elevação de cada Espírito.

 

242.

Como é que os Espíritos tem conhecimento sobre o passado? Esse conhecimento sobre o passado é ilimitado para os Espíritos?

 

Quando um Espírito se ocupa do passado, o passado vira presente. Quando um Espírito se ocupa do passado, acontece com o Espírito exatamente o que acontece com um homem que se recorda de qualquer coisa que tenha impressionado o homem durante a vida (física) do homem.

 

Para o Espírito já não existe o obstáculo do corpo material limitando a inteligência do Espírito, então o Espírito pode se lembrar mesmo daquilo que estivesse esquecido (adormecido) na memória do Espírito. Mas os Espíritos não sabem (se lembram) de tudo, começando pela (lembrança da) própria criação (do Espírito).

 

243.

E o futuro? Os Espíritos conhecem o futuro?

 

Isso também depende do grau de elevação que o Espírito tenha alcançado. Muitas vezes os Espíritos (mais elevados) apenas vislumbram o futuro, mas nem sempre os Espíritos tem permissão para revelar o futuro que os Espíritos tenham vislumbrado. Quando os Espíritos veem o futuro, é como se o futuro fosse o (momento) presente para o Espírito. O Espírito conhece o futuro cada vez mais claramente à medida que o Espírito mais se aproxima de Deus.

 

Depois da morte física a alma vê e compreende com um golpe de vista todas as existências físicas passadas que a alma teve, mas a alma não pode ver o que Deus possa ter reservado (no futuro) para a alma. Para que a alma seja capaz de ver o que Deus possa ter reservado para a alma no futuro, é preciso que a alma tenha se integrado nele (sic [5]) depois de múltiplas existências físicas.

 

243a.

Os Espíritos que já alcançaram a perfeição absoluta [6] tem conhecimento completo do futuro?

 

Não se pode falar em conhecimento "completo" pois apenas Deus é soberano senhor, e ninguém pode ser igual a Deus.

 

244.

Os Espíritos veem a Deus?

 

Só os Espíritos superiores veem e compreendem Deus. Os Espíritos inferiores sentem e adivinham Deus.

 

244a.

Quando um Espírito inferior diz que Deus proíbe ou permite uma coisa para aquele Espírito, como o Espírito sabe que a proibição ou a permissão vem de Deus?

 

O Espírito não vê Deus, mas o Espírito sente a sabedoria de Deus; o Espírito percebe (como uma intuição) a proibição de fazer alguma coisa, ou de falar alguma palavra, percebe quando aquela coisa não deve ser feita, ou quando aquela palavra não deve ser dita.

 

Os homens também tem pressentimentos que parecem ser avisos secretos para fazer ou não isto ou aquilo [7]. A mesma coisa acontece com os Espíritos, se bem que em um grau (intensidade) maior já que a essência dos Espíritos é mais sutil (menos grosseira) e os Espíritos podem – assim – receber melhor as advertências divinas.

 

244b.

Deus transmite a ordem diretamente para o Espírito, ou Deus transmite a ordem para o Espírito por intermédio de outros Espíritos?

 

O Espírito não recebe a ordem diretamente de Deus. O Espírito precisa ser digno para se comunicar (diretamente) com Deus. Deus transmite as ordens para os Espíritos por intermédio de outros Espíritos que são superiores em perfeição e em instrução.

 

245.

A visão dos Espíritos é limitada como a visão dos seres corpóreos?

 

Não. A visão dos Espíritos reside nos Espíritos (não depende de órgãos de um corpo físico).

 

246.

Os Espíritos precisam da luz para ver?

 

Os Espíritos veem por si mesmos (por conta própria) sem precisarem de luz exterior. Não há trevas para os Espíritos, a não ser as trevas (em sentido figurado) em que os Espíritos se encontrem por motivo de expiação.

 

247.

Para ver o que acontece em dois pontos diferentes, os Espíritos precisam se transportar para esses pontos diferentes? Os Espíritos podem, por exemplo, ver ao mesmo tempo (algo acontecendo) nos dois hemisférios do globo?

 

Como o Espírito se transporta com a rapidez do pensamento, pode ser dito que o Espírito vê em toda parte ao mesmo tempo. O pensamento do Espírito pode ser irradiado (como a luz de uma lâmpada) e pode ser dirigido para pontos muito diferentes ao mesmo tempo, mas essa faculdade (capacidade) depende da pureza do Espírito. Quanto menos puro o Espírito for, tanto mais a visão do Espírito será limitada. Só os Espíritos superiores podem abranger um conjunto com a vista.

 

 

 

 

A faculdade (capacidade) de ver do Espírito é uma propriedade (qualidade) que faz parte da natureza do Espírito, e que está em todo o seu ser [8], da mesma forma como a luz está em todas as partes de um corpo luminoso. A faculdade de ver do Espírito é uma espécie de lucidez universal que se estende a tudo – que abrange simultaneamente o espaço, os tempos, e as coisas. Não há trevas, nem obstáculos materiais para essa lucidez do Espírito.

 

É compreensível que deva ser assim. No homem a visão acontece pelo funcionamento de um órgão que a luz atinge. Daí, se não há luz, o homem fica sem poder envergar (ver). No Espírito, como a faculdade (capacidade) de ver é um atributo (qualidade) do Espírito – independente de qualquer fator exterior – a visão do Espírito é independente da presença de luz (ver a questão 92 sobre "onipresença dos Espíritos").

 

 

248.

O Espírito vê as coisas de forma tão clara como os homens veem?

 

O Espírito vê as coisas de forma mais clara do que os homens veem pois a visão do Espírito enxerga onde a visão dos homens não pode enxergar. Nada obscurece (atrapalha) a visão do Espírito.

 

249.

O Espírito percebe os sons?

 

Sim, e percebe mesmo sons que não podem ser percebidos pelos sentidos grosseiros dos homens.

 

249a.

A faculdade (capacidade) de ouvir do Espírito está em todo o seu ser, como acontece com a faculdade de ver do Espírito?

 

Todas as percepções do Espírito são atributos (qualidades) do Espírito e fazem parte de seu ser. Quando um Espírito está revestido de um corpo material (encarnado), as percepções só chegam ao Espírito quando são transmitidas pelos órgãos (físicos). Quando o Espírito está na condição de Espírito livre (não está encarnado), as percepções do Espírito deixam de estar localizadas (em órgãos de um corpo).

 

250.

Se as percepções do Espírito são atributos (qualidades) do próprio Espírito, o Espírito tem o poder de ignorar aquelas percepções?

 

O Espírito vê ou ouve apenas o que o Espírito quer ver ou ouvir. Isso é verdade de um ponto de vista mais geral e – em particular – é verdade para os Espíritos (mais) elevados. Os Espíritos (mais) imperfeitos muitas vezes veem e ouvem – mesmo que seja contra a vontade – o que possa ser útil para que se aperfeiçoem.

 

251.

Os Espíritos são sensíveis à música?

 

Quer dizer, à música dos homens? O que é a música dos homens comparada com a música celeste? Nada na Terra pode dar aos homens uma idéia da harmonia da música celeste. Em comparação com a música celeste que é uma melodia doce, a música dos homens seria como um canto selvagem.

 

Mesmo assim, Espíritos vulgares podem sentir um certo prazer em ouvir a música dos homens, já que aqueles Espíritos vulgares ainda não compreendem outra música mais sublime (elevada).

 

As qualidades sensitivas [9] dos Espíritos são muito desenvolvidas e por isso a música tem encantos infinitos para os Espíritos; quer dizer, a música celeste, que é tudo o que existe de mais belo e delicado que a imaginação espiritual pode conceber.

 

252.

Os Espíritos são sensíveis às belezas naturais?

 

As belezas naturais dos mundos são tão diferentes que estamos longe de conhecer todas as belezas naturais de todos os mundos. Sim, os Espíritos são sensíveis às belezas naturais, e de acordo com a aptidão (capacidade) que os Espíritos tenham para apreciar e compreender aquelas belezas naturais. Para os Espíritos (mais) elevados há belezas de conjunto que – por assim dizer – apagam (escondem) as belezas das particularidades [10].

 

253.

Os Espíritos sentem as (mesmas) necessidades e os (mesmos) sofrimentos físicos dos homens?

 

Os Espíritos se lembram e conhecem as necessidades e sofrimentos físicos dos homens porque os Espíritos já estiveram encarnados (como homens) e já tiveram aquelas necessidades e aqueles sofrimentos físicos. Mas os Espíritos não sentem materialmente aquelas necessidades e aqueles sofrimentos físicos como os homens sentem: são Espíritos.

 

254.

Os Espíritos sentem fadiga (cansaço) e tem necessidade de repouso?

 

Os Espíritos não podem sentir fadiga (cansaço) da forma como os homens entendem (cansaço físico). Então, os Espíritos não precisam de descanso corporal como os homens precisam, já que os Espíritos não possuem órgãos que precisem ter as forças renovadas.

 

Entretanto, o Espírito não está (sempre) em atividade constante e – nesse sentido – o Espírito repousa. O Espírito não age na matéria. Toda a ação (atividade) do Espírito é intelectual, e por isso o repouso do Espírito é inteiramente moral. Isso quer dizer que há momentos em que o pensamento do Espírito deixa de ser tão ativo como costuma ser, há momentos em que o pensamento do Espírito não se fixa em alguma coisa determinada. Esses momentos são um repouso verdadeiro para o Espírito, mas esse repouso não pode ser comparado ao repouso do corpo (físico).

 

O tipo de fadiga (cansaço) que os Espíritos podem sentir tem relação com o grau de superioridade ou de inferioridade dos Espíritos. Quanto mais elevado um Espírito é, menos repouso o Espírito precisa.

 

255.

Quando um Espírito diz que está sofrendo, o Espírito está falando de que tipo de sofrimento?

 

Os Espíritos estão falando de angústias morais. Aquelas angústias morais torturam os Espíritos de forma mais dolorosa do que os sofrimentos físicos.

 

256.

Como é então que alguns Espíritos tem se queixado de sofrer de frio ou de calor?

 

É uma lembrança do que os Espíritos sofreram durante a vida (física). Essa lembrança que os Espíritos tem costuma ser tão aflitiva (angustiante) quanto a realidade. Muitas vezes os Espíritos falam dessa forma (dizendo estar sentindo frio ou calor) como uma comparação para explicar a situação em que aqueles Espíritos estão, já que a comparação é a melhor forma que aqueles Espíritos encontram para dar a explicação.

 

Quando aqueles Espíritos se lembram do corpo físico que aqueles Espíritos tinham, aqueles Espíritos tem a impressão de que ainda possuem aquele corpo físico; é algo parecido com o que acontece com uma pessoa que tem a impressão de ainda estar vestindo alguma roupa mesmo depois de já ter tirado aquela roupa, e mesmo depois de já ter passado algum tempo que a pessoa não está mais vestindo aquela roupa.

 


 

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[1]        No caso, compreensão do sentido das coisas.

          PERCEPÇÃO: ação ou efeito de perceber, de compreender o sentido de algo por meio das sensações ou da inteligência; intuição geralmente de teor moral (por exemplo, percepção do bem e do mal); avaliação sobre coisas ou seres a partir de um julgamento ou opinião.

[2]        No caso, capacidade de compreender (o sentido das coisas).

          INTELIGÊNCIA: faculdade de conhecer, de compreender; intelecto; conhecimento profundo em (alguma coisa); habilidade para entender e solucionar adversidades ou problemas, adaptando-se a circunstâncias novas; função psíquica (mental) que contribui para que uma pessoa consiga entender o mundo, as coisas e situações, a essência dos fatos.

[3]        Ver questões 100 a 113 sobre "escala espírita".

[4]        Com certeza a medição e a passagem do tempo não são os mesmos em todos os mundos do universo, e é praticamente impossível que exista (no universo todo) um único padrão para medir a passagem do tempo.

[5]        Sic Erat Scriptum: traduzido como "assim estava escrito". Supõem-se que a palavra "nele", aqui, esteja se referindo ao futuro (da alma).

[6]        Certamente a palavra "absoluta" é aqui usada apenas como uma "forma de falar" para significar um "altíssimo grau": (1) se um Espírito tivesse alcançado a perfeição absoluta, o Espírito teria se igualado a Deus que é a perfeição absoluta em si mesmo; (2) como os Espíritos são eternos e estão sempre progredindo (independente do grau de elevação que os Espíritos já tenham alcançado), na prática não existe uma condição de "perfeição absoluta" pois sempre existirão (para o Espírito) oportunidades para que o Espírito seja ainda mais perfeito.

[7]        Ver questões 522 a 524 sobre "pressentimentos".

[8]        Isso pode ser entendido comparando com a forma como as pessoas sentem o calor ou o frio. A temperatura do ambiente não é sentida pelo corpo físico em um único ponto do corpo, mas em todo o corpo (pois não existe no corpo um órgão específico para sentir a temperatura do ambiente). Todas as partes do corpo físico sentem a temperatura (praticamente) da mesma forma, e ao mesmo tempo.

[9]        Qualidades sensitivas como a visão e a audição.

[10]       Por exemplo, a Via Láctea pode ser considerada bela como um todo, apesar de existirem planetas na Via Láctea que não tem uma aparência muito bonita ou atraente.

 

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