Parte III: Leis morais – Capítulo X: Lei de liberdade – Resumo teórico do móvel (motivo) das ações humanas

Livro dos Espíritos: linguagem simplificada - Resumo teórico do móvel (motivo) das ações humanas

 

Resumo teórico do móvel (motivo) das ações humanas

 

872.

A questão do livre-arbítrio (livre escolha) do homem pode ser resumida da seguinte forma.

 

O homem não é levado para o mal fatalmente. Os atos que o homem pratica não foram predeterminados de antemão. Os crimes que o homem pratica não são o resultado de uma "sentença" do destino.

 

Seja por prova (lição), ou seja por expiação (reparação das faltas), o Espírito do homem pode escolher uma existência física onde aquele homem seja incitado (estimulado) para o crime, seja por causa do meio (ambiente) onde aquele homem vive, seja por causa das circunstâncias que venham a existir na vida física daquele homem. Mas o homem sempre terá a liberdade para agir ou não (de uma ou de outra maneira).

 

Assim, em seu estado de Espírito desencarnado o homem tem o livre-arbítrio (livre escolha) quando aquele Espírito escolhe sua nova existência física, e quando aquele Espírito escolhe as provas (lições) de sua nova existência física.

 

Em seu estado de Espírito encarnado o homem  tem o livre-arbítrio (livre escolha) quando aquele homem tem a faculdade (capacidade) de ceder ou não aos arrastamentos (tentações) a que todos os homens se submetem de livre vontade.

 

O combate das más tendências do homem deve ser realizado através da educação (aperfeiçoamento) do homem. A educação de um homem terá sucesso (no combate das más tendências daquele homem) quando aquela educação estiver baseada em um estudo aprofundado da natureza moral daquele homem. A natureza moral daquele homem irá chegar a ser modificada através do conhecimento das leis que regem (regulam) a natureza moral dos homens, da mesma forma que a inteligência é modificada pela instrução, e da mesma forma que o temperamento é modificado pela higiene (sic [1]).

 

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Quando o Espírito está livre da matéria e está no estado de erraticidade [2], o Espírito faz a escolha de suas futuras existências corporais de acordo com o grau de adiantamento espiritual [3] que o Espírito tenha alcançado. Como dissemos, é sobretudo nisso que o Espírito tem livre-arbítrio (livre escolha). A liberdade do Espírito para fazer suas escolhas não desaparece com a encarnação do Espírito. O Espírito (encarnado) falha nas provas (lições) que ele mesmo escolheu se o Espírito (encarnado) não resiste à influência da matéria. O Espírito (encarnado) tem a permissão de invocar (pedir) a ajuda de Deus e dos Espíritos bons [4] para ter ajuda para vencer nas suas provas (lições).

 

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Sem o livre-arbítrio (livre escolha) o homem não teria nem culpa por praticar o mal, nem teria mérito por praticar o bem. A (justa) recompensa pelos atos praticados pelos homens está reconhecida (firmada) a tal ponto entre os homens que a censura ou o elogio pelos atos praticados pelos homens são feitos para a intenção (por trás daqueles atos praticados), isto é, são feitos pela vontade (do homem) que levou à prática daqueles atos.

 

Ora, quem diz vontade está também dizendo liberdade. Portanto, o homem não poderá usar sua organização física (corpo físico) como uma desculpa para os delitos que aquele homem comete, sem que aquele homem (usando tal desculpa) abra mão da sua razão (raciocínio), e sem que aquele homem (usando tal desculpa) abra mão de sua condição de ser humano (para – assim – se igualar a um ser bruto). Se as coisas são assim no que diz respeito ao mal, então as coisas não podem ser diferentes no que diz respeito ao bem.

 

Mas quando o homem pratica o bem, o homem toma bastante cuidado para que o bem que o homem praticou seja levado em conta a seu favor como um mérito. Tal homem sequer pensa em agradecer os órgãos do seu corpo físico pelo bem que tal homem tenha praticado. Isso prova que por instinto o homem não renuncia (abre mão) ao privilégio mais belo da espécie humana, que é a liberdade de pensar (apesar da opinião de algumas pessoas que defendem certos sistemas filosóficos – sic [5]).

 

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A "fatalidade", da forma como a "fatalidade" é vulgarmente (popularmente) entendida, supõe a existência de uma decisão prévia e irrevogável (que não pode ser mudada) sobre todos os sucessos da vida (material), qualquer que seja a importância daqueles sucessos. Se a ordem das coisas fosse dessa forma, o homem seria igual a uma máquina sem vontade própria. Se o homem estivesse invariavelmente (constantemente) dominado pela força do destino em todos os atos que o homem pratica, qual seria a utilidade da inteligência para o homem?

 

Se uma doutrina ("fatalidade") dessas fosse verdadeira, tal doutrina conteria a destruição de toda a liberdade moral. Já não haveria mais qualquer responsabilidade para o homem, e – por consequência – já não haveria mais nem o bem e nem o mal, já não haveria mais nem os crimes e nem as virtudes.

 

É impossível que Deus (soberanamente justo) fosse castigar Suas criaturas por faltas cometidas por aquelas criaturas sem que o ato de cometer aquelas faltas dependesse daquelas criaturas. É impossível que Deus (soberanamente justo) fosse recompensar Suas criaturas pelos méritos que aquelas criaturas pudessem ter sem um merecimento.

 

Além disso, uma lei (de "fatalidade") seria a negação da lei do progresso [6]  porque o homem – esperando tudo da "sorte" – não faria nada para melhorar a sua própria posição (condição), já que o homem não iria conseguir ser nem mais e nem menos do que ele (homem) já é.

 

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Contudo, a "fatalidade" não é uma palavra vã (inútil). A "fatalidade" existe na posição (condição) que o homem tem na Terra, e existe nas funções (tarefas) que o homem executa na Terra, como uma consequência do gênero (tipo) de vida física que o Espírito do homem escolheu (antes de encarnar), como forma de uma prova (lição) [7], ou como forma de uma expiação (reparação das faltas), ou como forma de uma missão [8].

 

O homem sofre fatalmente todas as vicissitudes (dificuldades) da existência física que o próprio Espírito daquele homem escolheu (antes de encarnar). O homem sofre fatalmente todas as vicissitudes (dificuldades) das tendências boas ou más que o homem carrega em seu íntimo. Mas a "fatalidade" acaba aí, pois depende apenas da vontade do homem se o homem vai ou não ceder às tendências boas ou más que o homem carrega em seu íntimo.

 

Os detalhes dos acontecimentos na vida física do homem dependem das circunstâncias que o próprio homem cria através de seus próprios atos, e os Espíritos podem influir naquelas circunstâncias através dos pensamentos que os Espíritos sugerem para o homem. [9]

 

Portanto, a "fatalidade" está nos acontecimento que ocorrem na vida física do homem porque aqueles acontecimentos são uma consequência da escolha que o Espírito do homem fez (antes de encarnar) sobre a existência física daquele Espírito encarnado como homem. Pode deixar de existir "fatalidade" nas consequências daqueles acontecimentos já que é possível que o homem modifique o curso (rumo) dos acontecimentos através de sua própria prudência. Mas nunca existe "fatalidade" nos atos da vida moral do homem.

 

É na morte física que o homem está absolutamente submetido (sujeito) à inexorável (implacável) lei da fatalidade, pois o homem não pode escapar da sentença que marca o fim da sua existência física, nem pode escapar do gênero (tipo) de morte física que irá pôr fim à sua existência física.

 

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Segundo a doutrina (crença) vulgar (popular) o homem tiraria de si mesmo todos os seus instintos. Então, os instintos do homem viriam da organização física (corpo físico) do homem, ou viriam da natureza do homem, e o homem não tem nenhuma responsabilidade por sua própria organização física (corpo físico). Se assim fosse, seria lícito (válido) se o homem tentasse se desculpar consigo mesmo dizendo que ele não tem culpa de ser feito como ele é.

 

Sem sombra de dúvidas, a Doutrina Espírita é muito mais moral (do que a crença vulgar). A Doutrina Espírita admite (concorda) a existência do livre-arbítrio (livre escolha) no homem – em toda a sua plenitude (totalidade) – quando a  Doutrina Espírita diz (prega) para o homem que o homem não tem sua responsabilidade diminuída (em nada) quando aquele homem cede à uma sugestão (tendência) estranha e má e acaba praticando o mal, pois a Doutrina Espírita reconhece que o homem tem o poder de resistir e de não praticar o mal (o que é – evidentemente – muito mais fácil de se fazer do que lutar contra a própria natureza física).

 

Assim, de acordo com a Doutrina Espírita não existe arrastamento (tentação) irresistível. O homem sempre pode se negar a dar ouvidos àquela voz oculta que fala para o íntimo do homem procurando levar o homem para o mal, da mesma forma que o homem pode se negar a dar ouvidos à voz (material) das pessoas que falam com o homem abertamente.

 

O homem tem esse poder através de sua própria vontade, pedindo a Deus a força que ele (homem) precisa (para resistir) e pedindo a ajuda dos Espíritos bons com o mesmo objetivo (de resistir).

 

Foi isso que Jesus ensinou para os homens por meio da sublime (elevada) prece que é a Oração Dominical ("Pai Nosso"), quando Jesus manda que os homens digam: "não nos deixes cair na tentação, mas livra-nos do mal".

 

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Essa teoria (suposição) sobre a causa que determina os atos dos homens se destaca (pode ser percebida) com evidência de todo o ensino dado pelos Espíritos (superiores). Aquela teoria (Doutrina Espírita) não só é de uma moralidade sublime (elevada) como também – acrescentamos – eleva o homem aos seus próprios olhos.

 

Aquela teoria (Doutrina Espírita) mostra que o homem está livre para escapar de um jugo (escravidão) de obsessão (dominação), da mesma forma que o homem tem a liberdade de fechar a sua casa e deixar os importunos do lado de fora. Assim, o homem deixa de ser uma simples máquina (agindo por causa de uma motivação que é independente de sua própria vontade), e o homem passa a ser um ser racional que ouve, que julga, e que escolhe um conselho entre dois conselhos à sua disposição.

 

Concordemos que apesar dos conselhos que o homem tem à sua disposição, o homem não está privado de iniciativa, e o homem não deixa de agir por impulso (vontade) próprio, pois no final das contas o homem é apenas um Espírito (encarnado) que conserva (no envoltório corporal) as qualidades e os defeitos que aquele Espírito tinha (antes de encarnar).

 

Por consequência, as faltas que o homem comete tem sua origem primária (principal) na imperfeição do próprio Espírito do homem. O homem ainda não conseguiu a superioridade moral que o homem um dia o homem irá conseguir, mas nem por isso falta livre-arbítrio (livre escolha) para o homem.

 

A vida corpórea é dada para o homem para que o homem se livre de suas próprias imperfeições através das provas (lições) que o homem suporta em sua vida física. São aquelas imperfeições do homem que fazem com que o homem seja mais fraco e com mais chances de ceder às sugestões de outros Espíritos imperfeitos. Os Espíritos imperfeitos se aproveitam daquelas imperfeições do homem para tentar fazer com que o homem falhe na luta que o homem está travando (com suas imperfeições) [10].

 

Se o homem sai vencedor das lutas que o homem trava durante sua vida física, o homem se eleva (espiritualmente). Se o homem fracassa nas lutas que o homem trava durante sua vida física, o homem continua sendo o que o homem já era (nem pior e nem melhor). As provas (lições) onde o homem fracassa são provas (lições) que o homem terá que recomeçar, e pode ser que o homem passe muito tempo recomeçando as provas (lições) onde o homem fracassa.

 

Quanto mais o homem se depura (purifica), tanto mais os pontos fracos do homem diminuem, e tanto menores são as chances daqueles (Espíritos) que tentam atrair o homem para o mal. A força moral do homem aumenta na mesma proporção em que a elevação (espiritual) do homem aumenta, fazendo – assim – com que os Espíritos maus (imperfeitos) se afastem do homem [11].

 

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Todos os Espíritos que estão encarnados (na Terra) são Espírito mais, ou menos bons e formam a espécie humana. Como a Terra é um dos mundos menos adiantados (espiritualmente), entre os Espíritos que estão encarnados na Terra há um número (muito) maior de Espíritos maus (imperfeitos) do que de Espíritos bons. É por essa razão que existe tanta perversidade (maldade) por aí.

 

Portanto, o homem deve fazer todos os esforços para não precisar mais retornar para este planeta depois da existência física atual, e para merecer ir repousar (habitar) em um mundo melhor do que a Terra, em um daqueles mundos privilegiados onde o bem reina absoluto, e onde o homem não irá se lembrar de sua passagem pela Terra (a não ser como tendo sido um exílio temporário).

 


 

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[1]

Sic Erat Scriptum: traduzido como "assim estava escrito".

 

[2]

Estado errante (ou erraticidade) é o estado do Espírito que está no mundo espiritual (não está encarnado, portanto), aguardando uma próxima encarnação.

ERRANTE: que anda sem destino; característica do que ou de quem vive a vaguear; que não possui uma residência fixa.

 

[3]

Ver questões 100 a 113 sobre "escala espírita".

 

[4]

Ver questão 489 a 521 sobre "anjos guardiães, Espíritos protetores, Espíritos familiares ou Espíritos simpáticos".

 

[5]

Sic Erat Scriptum: traduzido como "assim estava escrito".

 

[6]

Ver "Lei do progresso".

 

[7]

Ver questão 258 a 273 sobre "escolha das provas".

 

[8]

Ver questão 558 a 584 sobre "as ocupações e missões dos Espíritos".

 

[9]

Ver questão 459.

 

[10]

Ver questão 122. Ver questão 281. Ver questão 466.

 

[11]

Ver questão 467 a 469.

 

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