Parte III: Leis morais – Capítulo VI: Lei de destruição – Destruição necessária e destruição abusiva
Destruição necessária e destruição abusiva
728. | ||
| – | É preciso que tudo se destrua para renascer e se regenerar, porque aquilo que os homens chamam de "destruição" não passa de uma transformação que tem por fim (objetivo) a renovação e a melhoria dos seres vivos. |
728a. | Desse modo, o instinto de destruição teria sido dado para os seres vivos pelos desígnios da Providência (divina)? | |
| – | As criaturas são instrumentos utilizados por Deus para chegar aos Seus objetivos. Os seres vivos se destroem uns aos outros para se alimentarem, e essa destruição tem um fim (objetivo) duplo: primeiro, a manutenção do equilíbrio na reprodução que poderia ser chamada de "excessiva" [3] e, segundo, a utilização dos despojos (restos) do envoltório (corpo físico) que é destruído.
Porém, sempre é apenas o envoltório (corpo físico) que é destruído pois aquele envoltório é um simples acessório, aquele envoltório não é uma parte essencial do ser vivo. A parte essencial do ser vivo é o princípio inteligente [4] . O princípio inteligente não pode ser destruído e se elabora (se desenvolve com dedicação e por etapas) nas metamorfoses (transformações) pelas quais o princípio inteligente passa. |
729. | Se a destruição (dos seres vivos) é necessária por causa da necessidade da regeneração (dos seres vivos), por que a natureza cerca os seres vivos de meios de (auto) preservação e de meios de (auto) conservação? | |
| – | A natureza cerca os seres vivos de meios de (auto) preservação e de meios de (auto) conservação a fim de que a destruição (dos seres vivos) não aconteça antes do tempo (certo). Toda destruição antes do tempo (certo) impede o desenvolvimento do princípio inteligente (que habita o ser vivo destruído). É por isso que Deus fez cada ser experimentar (possuir) a necessidade de viver e a necessidade de se reproduzir. |
730. | Uma vez que a morte (física) faz o homem passar para uma vida melhor, livrando o homem dos males da vida física (e – portanto – a morte física deveria ser mais desejada do que é temida), por que o homem tem instintivamente um tal horror da morte (física) a ponto da morte (física) ser um motivo de apreensão (preocupação) para o homem? | |
| – | Já dissemos que o homem deve procurar prolongar sua vida para cumprir a tarefa que cabe ao homem. É por isso que Deus deu o instinto de (auto) conservação para o homem. É o instinto de (auto) conservação que sustenta o homem nas provas (lições) que o homem suporta. Se não fosse assim, o homem se entregaria para o desânimo muitas vezes.
A voz íntima (interior) que leva o homem a repelir (afastar) a morte diz para o homem que o homem ainda pode realizar alguma coisa pelo seu próprio progresso (permanecendo vivo).
A ameaça de um perigo (para a vida do homem) é um aviso para que o homem aproveite o adiamento (da morte) que Deus concede (dá) para o homem. Mas o homem é ingrato e na maioria das vezes dá graças para sua "estrela" (da sorte) ao invés de dar graças para o seu Criador. |
731. | Por que a natureza colocou os agentes (mecanismos) de destruição ao lado dos meios de (auto) conservação? | |
| – | É o remédio (colocado) ao lado do mal. Já dissemos: isso é assim para manter o equilíbrio e servir de contrapeso (compensação) [5]. |
732. | A necessidade de destruição é igual em todos os mundos? | |
| – | A necessidade de destruição está de acordo com o estado (condição) mais ou menos material de cada mundo. A necessidade de destruição desaparece quando o físico e o moral estão mais depurados (refinados). As condições de existência (física) nos mundos mais adiantados do que a Terra são muito diversas. |
733. | A necessidade de destruição irá sempre existir entre os homens da Terra? | |
| – | A necessidade de destruição se enfraquece no homem na medida em que o Espírito (do homem) sobrepuja (domina e ultrapassa) a matéria. Como é possível ser observado, tanto é assim que o horror à destruição cresce (no homem) com o desenvolvimento (aumento) intelectual e moral (do homem). |
734. | No estado atual (de evolução) do homem, o homem tem um direito ilimitado de destruição sobre os animais? | |
| – | O direito do homem de destruição sobre os animais está regulado (controlado e limitado) pela necessidade que o homem tem de prover (cuidar) ao seu próprio sustento e à sua própria segurança. O abuso jamais é um direito [6]. |
735. | O que deve ser pensado da destruição quando a destruição vai além dos limites que as necessidades (do homem) traçam (definem), e que a segurança (do homem) traça (define)? Por exemplo, o que deve ser pensado da caça que não tem outro objetivo que não seja o prazer de destruir sem qualquer utilidade? | |
| – | Isso é um sinal da predominância da bestialidade sobre a natureza espiritual. Toda destruição que vai além dos limites (da natureza) é uma violação das leis de Deus. Os animais só destroem para satisfazer as próprias necessidades, enquanto que o homem – com o seu livre-arbítrio – destrói sem necessidade. O homem terá que prestar contas (para Deus) do abuso da liberdade que foi dada para o homem, pois isso (abuso) significa que o homem está cedendo aos seus maus instintos. |
736. | Os povos que levam ao excesso o escrúpulo no que diz respeito à destruição dos animais teriam um merecimento especial? | |
| – | Tal excesso é um sentimento louvável em si mesmo, mas tal excesso se torna abusivo (sic [7]), e o merecimento de tal excesso fica neutralizado por causa de abusos de muitas outras espécies. Há mais temor supersticioso entre tais povos, do que há bondade verdadeira. |
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[1] Aqui, a palavra "destruição" tem o significado de "transformação" e de "renovação". Para que algo novo seja criado, ou para que algo seja melhorado, é necessário que aquilo que era velho ou ultrapassado seja destruído.
[2] Ver "Lei divina ou natural".
[4] Ver questão 21 a 28 sobre "espírito e matéria". Ver questão 76 a 83 sobre "origem e natureza dos Espíritos". Ver questão 606 e 607 sobre "os animais e o homem". Ver questão 611 sobre "metempsicose".
[6] Ver questão 711 a 714 sobre "gozo dos bens terrenos". Ver questão 715 a 717 sobre "o necessário e o supérfluo".
[7] Sic Erat Scriptum: traduzido como "assim estava escrito".
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